Crescimento Acelerado da Inteligência Artificial no Brasil: O Que Isso Revela?
A rapidez com que os brasileiros estão adotando ferramentas de inteligência artificial generativa é impressionante e reflete um cenário semelhante ao da ascensão das redes sociais. Um estudo recente revelou que, em apenas um ano, a porcentagem de usuários de internet no Brasil que utilizam IA saltou de 63% para 89%. O uso constante dessas tecnologias duplicou, assim como o número de empresas que incorporaram a inteligência artificial em suas operações.
Esses dados não apenas destacam o caráter inovador do Brasil como um “early adopter” de tecnologias emergentes, mas também levantam questões cruciais sobre a nossa capacidade de lidar com a confiança em ferramentas tecnológicas que ainda estão em fase de desenvolvimento.
Os resultados deste fenômeno foram apresentados na segunda edição do estudo “Inteligência Artificial na Vida Real”, conduzido pela Talk Inc. O enfoque da pesquisa foi em como a população comum interage com a tecnologia, afastando-se da busca por “superusuários” que frequentemente utilizam IA.
A evolução do conhecimento sobre IA entre os brasileiros é notável. De 2024 para 2025, o percentual de pessoas que afirmam ter um bom entendimento sobre a tecnologia subiu de 68% para 81%. Além disso, a frequência de usuários regulares de sistemas de IA também cresceu substancialmente, passando de menos de 30% para 52%.
Carla Mayumi, sócia fundadora da Talk Inc, ressalta que essa adoção acelerada foi observada em diversos aspectos da vida dos brasileiros. O número de empresas que utilizam ferramentas de IA teve um aumento expressivo, de 29% para 60%, enquanto o uso da tecnologia para conselhos também dobrou.
A Queda na Percepção de Risco
Com o aumento da adoção da IA veio a diminuição da preocupação com os riscos associados a essa tecnologia. Em 2024, 77% da população estava preocupada com a invasão de privacidade e o uso indevido dos dados. Agora, esse número caiu para 69%. Além disso, o temor em relação à disseminação de notícias falsas e deep fakes registrou uma queda similar, de 80% para 74%.
Embora as ferramentas de IA mais utilizadas pelos brasileiros sejam de grandes empresas de tecnologia, a percepção sobre o risco de manipulação e controle por parte dessas corporações diminuiu. Os sistemas mais mencionados no país são o ChatGPT, da OpenAI, o Gemini, do Google, e o Meta AI, da Meta.
Contudo, especialistas alertam que os usuários estão interagindo com essas tecnologias sem compreender plenamente o que estão utilizando, o que representa um risco significativo, segundo Carla.
A Complexidade da IA e Seus Desafios
Os modelos de IA generativa mais conhecidos não são transparentes, o que levanta preocupações em relação à “caixa-preta” da tecnologia. As decisões tomadas por esses sistemas muitas vezes não são compreendidas até mesmo por seus criadores, dado o nível de complexidade envolvido.
Casos recentes, como denúncias de que o ChatGPT produziu respostas inadequadas para adolescentes e que o Meta AI vazou conversas privadas, levantam questões sérias sobre a confiabilidade dessas ferramentas. Para Tiago Longuini, diretor executivo do Instituto Kunumi, o uso responsável da tecnologia ainda está em fase de experimentação.
A Visão do Futuro
Os brasileiros que optam por IA percebem-na como uma espécie de super-poder. Uma significativa maioria, 74%, relatou sentir-se mais produtiva e organizada ao utilizar essas ferramentas. Notavelmente, a ansiedade relacionada à preguiça por delegar tarefas à IA diminuiu, passando de 68% para 62%.
Entretanto, a preocupação com a dependência da tecnologia permanece. Um cenário ambivalente se apresenta: ao mesmo tempo que uma parte da população teme a dependência, 62% se sentem mais produtivos, 56% mais criativos e 54% mais inteligentes ao interagir com a IA.
Esse paradoxo também se estende ao mercado de trabalho, onde 62% das pessoas expressam preocupação com a possibilidade de desemprego, e 46% temem pelo próprio cargo. A expectativa de que a IA se torne parte integrante das equipes de trabalho é crescente, com um terço dos entrevistados prevendo que isso ocorrerá nos próximos cinco anos.
Uma Reflexão Necessária
A adoção rápida e generalizada de IA no Brasil revela um espaço semelhante ao que foi observado durante a ascensão das redes sociais. A falta de um letramento digital robusto já se tornou evidente, e especialistas como Pedro Markun, do Transparência Hacker, enfatizam que ainda é possível corrigir esse cenário antes que o uso da IA se torne comum.
A pesquisa também indica que o uso da IA como um conselheiro tem se popularizado, com muitos brasileiros optando por essa tecnologia para conversas íntimas devido à conveniência que ela oferece. Contudo, essa prática levanta sérias preocupações sobre o impacto que a IA pode ter nas relações humanas, como alerta o psicanalista André Alves. Ele aponta para os riscos da “psicose de IA”, onde as interações com assistentes digitais podem amplificar ansiedades e paranoia.
A situação exige uma atenção cuidadosa, visto que a conveniência da IA pode nos levar a um estado de entorpecimento em relação às suas implicações. A capacidade de equilibrar o uso dessa tecnologia com uma compreensão crítica do que está em jogo será fundamental nos próximos anos.
Imagem Redação
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