América Latina: Alto Consumo de Inteligência Artificial, Mas Baixo Investimento
A América Latina se encontra em uma situação paradoxal: apesar de ser uma das regiões com maior consumo de inteligência artificial generativa (IA), permanece como uma das que menos investe nessa tecnologia estratégica. A discrepância é alarmante e merece atenção, uma vez que o avanço tecnológico está diretamente ligado ao crescimento econômico e à inovação.
De acordo com um relatório recente do Centro Nacional de Inteligência Artificial do Chile (CENIA) em parceria com a CEPAL, nenhum dos países latinos alcança a média global de investimento em IA como porcentagem do PIB per capita. A média regional é seis vezes inferior a esse parâmetro, evidenciando um descompasso significativo. A região, que representa 6,6% do PIB global e 8,8% da população mundial, responde por apenas 1,12% do investimento total em IA.
É surpreendente observar que, apesar desse baixo investimento, a América Latina destaca-se como uma das principais regiões do mundo em termos de uso de IA generativa. Antonia Moreno, chefe de estudos do CENIA, afirma que a América Latina é o terceiro maior mercado mundial em downloads de aplicativos de inteligência artificial generativa. Esse fenômeno pode ser explicado pela acessibilidade da tecnologia, que não exige infraestrutura complexa ou conhecimento altamente especializado, facilitando sua adoção.
O Índice Latino-Americano de Inteligência Artificial (ILIA), desenvolvido neste ano pela CENIA e pela CEPAL, analisou como a IA está sendo utilizada na região. Apesar de reconhecer o avanço na adoção e desenvolvimento da inteligência artificial, Moreno ressalta que há um espaço significativo que o mercado ainda não está explorando. “Existe uma oportunidade que o mercado não está aproveitando totalmente”, reforça.
Uma análise da Accenture e Oracle destaca que 80% dos bancos brasileiros já implementaram IA generativa, resultando em uma impressionante melhoria média de 11,4% na eficiência operacional. Ademais, espera-se que até 2027, 25% do orçamento de TI das grandes empresas da região seja destinado à IA, sinalizando uma mudança importante no cenário tecnológico.
Em relação ao desenvolvimento de IA, Chile, Brasil e Uruguai estão na vanguarda, apresentando resultados robustos nas três dimensões avaliadas pelo ILIA: fatores facilitadores, pesquisa e desenvolvimento, e adoção e governança. “Os países com melhor desempenho estão tomando iniciativas em várias direções. Eles têm uma estratégia clara e uma visão de como avançar”, observa Moreno.
No total, dos 19 países avaliados no ILIA, nove já possuem estratégias nacionais de IA. Isso demonstra um comprometimento crescente com a transformação digital, essencial para se manter competitivo no cenário global. A Accenture projeta que uma adoção estratégica da IA generativa pode acelerar a inovação, contribuindo significativamente para o PIB da região — estimativas indicam que essa contribuição pode chegar a até US$ 1 trilhão até 2038.
Apesar de conquistas em termos de adoção, setores como o de data centers ainda precisam de atenção. Enquanto países como Chile e México têm atraído investimentos significativos nessa área, a capacidade de computação per capita ainda deixa a desejar. O investimento em data centers, tanto soberanos quanto privados, viu um aumento notável este ano, com investimentos públicos atingindo quase US$ 200 milhões e projeções privadas que ultrapassam os US$ 8 bilhões nos próximos dez anos.
O Brasil lidera em termos de capacidade de computação, detendo 90% da infraestrutura instalada na região. Com impressionantes 121.000 teraflops por segundo de capacidade de computação de alto desempenho, o Brasil supera significativamente outros países, como Argentina e México. Entretanto, para que a região alcance seu potencial, é fundamental que mais de metade dos países, que ainda carecem de infraestrutura robusta de alto desempenho, invistam mais nesse setor.
Quando se trata de internet e computadores, Brasil, Uruguai e Chile se destacam. Entretanto, 11 dos 19 países medidos pelo ILIA não alcançam 50 pontos, evidenciando uma grande lacuna no acesso à infraestrutura tecnológica. Apesar desse cenário, Brasil, Uruguai, Costa Rica e República Dominicana estão apresentando crescimento acelerado nessas áreas.
Os resultados mostram que, pelo terceiro ano consecutivo, o Chile foi o líder do índice, com 70,5 pontos, seguido pelo Brasil (67,3) e Uruguai (62,3). Outros países que também se destacam na adoção de IA incluem Colômbia, Costa Rica, Argentina e Peru, embora muitos países ainda enfrentem desafios significativos relacionados a infraestrutura e governança.
O desenvolvimento contínuo de talentos humanos na área de IA é crucial para a evolução desta tecnologia na região. Dados do relatório indicam que a alfabetização em IA é quase o dobro em comparação aos treinamentos vocacionais, mostrando a necessidade de uma maior ênfase na formação de especialistas.
Com desafios e oportunidades claras à frente, a América Latina precisa, mais do que nunca, investir em inteligência artificial não apenas para acompanhar, mas para liderar em inovação e eficiência no cenário global.
Imagem Redação
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